Há 31 anos meu avô paterno se foi. Não lembro dele e isso me dói. Minha mãe diz que eu era muito apegada a ele e todo dia pela manhã, principalmente depois que ele ficou doente, eu ia visitá-lo (eramos vizinhos) e brincava com ele. No dia 6/4/72 eu não perguntei por ele. Nunca mais perguntei. E acabei distraindo todos, pois corria pra lá e pra cá e achava que todas aquelas flores na casa da minha avó significavam festa.
Restava apenas uma semana para nos mudarmos para as casas novas. Meu avô já havia feito planos para os netos : iria construir um carrinho para levar todos pra passear nas ruas tranquilas do novo bairro. No momento eramos 3. Ele ia construir uma casinha para eu brincar também. Fiquei sem casinha, fiquei sem passeios, fiquei sem meu avô. O que tenho dele é uma boneca de pano que ele mesmo fez (sem cabelos para que eu não os colocasse na boca). Ele pediu alguns retalhos para a minha vó e ele mesmo cortou e costurou. Até "bordou" um rosto para a boneca. Não vendo, não troco e não dou. Mostrei à minha sobrinha - como se ela entendesse alguma coisa - mas não dou. Se um dia eu tiver uma filha, então ela ganha a boneca que foi feita pelo bisavô dela.
Meu avô era divertido e vivia fazendo zona nos colégios; tanto é que foi expulso de uns 3 e acabou cursando somente até a 4a série do primário. Ele soltava ratos na sala de aula, vespas... Também colocava tachinhas na cadeira dos padres (que eram os professores de um dos colégios) e chegou a colocar daquelas bombinhas que a gente acende como fósforo debaixo da batina de um deles. Cresceu e não mudou. Pediu para que meu pai, então estudante de Química, conseguisse umas substâncias bem fedidas pra colocar no escritório, já que o cocô de plástico - que foi parar na cadeira do chefe - já tinha perdido a graça. Uma vez ele foi a um cinema que tinha 2 andares e jogou azul de metileno lá de cima. Estava calor e naquela época não existia ar-condicionado. O povo suava dentro da sala e, claro, passava a mão ou o lenço no rosto. Saiu muita gente azul de dentro do cinema :)
Ele não se importava muito com a aparência e chegou algumas vezes em casa sem paletó, por ter dado pra alguém na rua. E quando saía minha avó às vezes implicava : "Vai sair assim?" Ele fazia uma cara de espanto e se olhava no espelho : "Estou rasgado? Estou cagado?" :D Ou, quando estava com o colarinho torto, minha avó pedia pra ele arrumar, ele simplesmente levantava a ponta do outro. Claro que isso era só pra irritar a minha avó, de quem ele gostava muito e morria de ciúmes. Não sei até hoje como foi que eles se casaram. Minha avó é toda alemã, certinha e cheia de etiqueta. E meu avô era este cara engraçado que adorava contar piada de alemão na frente dela :D
Uma vez, em um concerto, umas senhoras que ele não conhecia perguntaram qual seria a peça que os músicos tocariam de bis, pois elas não haviam escutado o nome direito. Ele também não, mas virou-se todo sério e falou "Sagu com vinho".
Este era o vô Acyr. O médico mandou ele parar de fumar depois do primeiro enfarto, mas ele não parou. Morreu dormindo. Minha família disse que até foi bom que isso tenha acontecido quando não tínhamos muita noção de nada, pois o golpe seria duro nos netos.
Vô, eu sei que você estava no casamento do meu irmão, assim como você sempre disse que estaria no meu. Não casei e acho que isso não vai acontecer, mas sei que você está por aí, olhando pelos seus netos. E sei que a inspiração pra tanta coisa que meu irmão e minha prima fizeram só pode ter vindo de um lugar :)
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